Agora é oficial: o vírus da zika circula pelo Distrito Federal. Um bebê de menos de dois meses foi diagnosticado por microcefalia causada pela doença adquirida na capital, já que a mãe garante que não deixou a cidade antes e durante a gestação. Ela não percebeu os sintomas, mais brandos que os da dengue, e a criança terá de receber acompanhamento pelo resto da vida. Desde o ano passado, a virose cresceu quase 10.000% e, com as outras endemias transmitidas pelo Aedes aegypti. 

Neste ano, 22 pessoas morreram em função da dengue. O boletim epidemiológico mostra que houve crescimento de 88% no número de casos notificados e prováveis entre 2015 e 2016 na capital. Os registros subiram de 23.155 para 43.710.
Brazlândia, Ceilândia, São Sebastião, Taguatinga, Planaltina e Samambaia são as regiões com maior número de casos: 9.895, ou 56% do total. A maior incidência ocorre em fevereiro e março.
A febre chikungunya teve um crescimento de quase 1.000%. Até agora, o número de detecções saltou de 17 para 163. Em junho, uma pessoa morreu em virtude da doença: um homem de 66 anos, três dias depois da internação. Ceilândia, Taguatinga, Samambaia, Gama, Asa Norte e Sobradinho têm o maior número de casos. Juntas, as cidades representam 55% dos diagnósticos.

O nascimento do bebê com microcefalia relacionada à zika ocorreu em 26 de outubro, mas os sintomas na mãe apareceram no início da gestação: febre baixa, manchas vermelhas na pele e leve dor de cabeça. “São sinais clássicos de uma virose comum. A mãe não se preocupou e tocou a vida. A gestação foi normal, com mais de nove consultas até o parto”, contou Rodrigo Miranda, gerente de Epidemiologia de Campo da Subsecretaria de Vigilância à Saúde.

Hoje, a criança é acompanhada por uma equipe multidisciplinar da rede pública, que avalia as complicações da malformação e trabalha na reabilitação. Ela precisará de amparo por toda a vida, já que as funções são comprometidas. Ela esteve em três consultas no Sarah Kubitschek, fez consulta no Hospital Materno Infantil de Brasília, onde tem outra agendada para o próximo dia 29, além ser acompanhada em um centro de saúde de Samambaia.

A comprovação aconteceu após o nascimento. Houve a investigação clínica, quando se observaram os sinais físicos da criança; a investigação de imagem, com uma ultrassonografia e uma tomografia computadorizada, que indicou uma série de alterações no sistema nervoso central; e o exame laboratorial de sangue. O caso ainda passou pelo Comitê Técnico de Enfrentamento para uma série de especialistas baterem o martelo.
Até então, os nascimentos de crianças com microcefalia no DF foram fruto de infecção em outras unidades da Federação ou a malformação não teve a correlação confirmada com o micro-organismo. Ao todo, segundo o gerente de Epidemiologia de Campo, 69 casos suspeitos foram investigados desde o ano passado e outras duas crianças tiveram confirmação de microcefalia por zika: um adquirido no Rio de Janeiro, que passa por acompanhamento e já fez o primeiro aniversário, e outro, infectado em Maceió, que viveu pouco mais de duas horas.

O último boletim detalha que, de 40 grávidas infectadas pelo vírus neste ano, 31 tiveram os bebês e 28 deles nasceram aparentemente sem condição relacionada ao vírus. Dois morreram após o nascimento, incluindo um em que foi diagnosticada “malformação decorrente da infecção” pelo vírus no primeiro trimestre de gestação. Dos 31 partos, 25 de são moradoras do DF, nove de Samambaia.


Investimento
Segundo a Secretaria de Saúde, o DF recebeu R$ 3,15 milhões de incentivo financeiro para qualificação das ações de vigilância, prevenção e controle da dengue. A pasta garante que R$ 3,12 milhões foram empenhados. A autorização do repasse do Piso Variável de Vigilância em Saúde parte de uma portaria de 2013.
De acordo com um levantamento da Comissão de Educação, Saúde e Cultura (Cesc), da Câmara Legislativa, dos R$ 14,3 milhões autorizados para o desenvolvimento de ações neste ano, somente R$ 3,4 milhões foram gastos. Em 2015, segundo demonstrativo da utilização de recursos da própria Secretaria de Saúde, dos R$ 20,4 milhões destinados à área, apenas R$ 5,7 milhões foram empenhados: 28%.

A contaminação cresceu 9.700% desde 2015. A Secretaria de Saúde confirmou 196 casos neste ano, enquanto, em todo 2015, foram dois. Do total de diagnósticos, 173 pacientes moram no DF. Taguatinga tem o maior número (31), seguida da Asa Norte (13) e Asa Sul, Guará e Lago Norte, com 12 cada.

Cuidado em dobro entre as gestantes

A notícia do caso confirmado faz as gestantes se protegerem ainda mais. Na sétima gravidez, Paula Cristina, 30, garante que sempre teve cuidados. “Mas agora tem que ser ainda mais intenso por causa dessas doenças”, diz. Ela busca eliminar qualquer água parada que possa abrigar o mosquito transmissor e mantém telas de proteção nas janelas. As mãos, por sua vez, passam por limpeza constante.

“É um problema de todos. Mas nós, que estamos esperando por um filho, temos de ter ainda mais cuidado”, afirma a mulher, que, no oitavo mês de gestação, espera ter Júlia nos braços com saúde.

Também no oitavo mês, Gardênia Sena, 26 anos, foca no repelente para afastar os mosquitos. “Em casa, tomo muito cuidado, mas não vejo muita preocupação das pessoas na rua”, reclama.

“Nunca um vetor pequeno trouxe epidemias tão explosivas”, avisa Rodrigo Miranda, da Subsecretaria de Vigilância à Saúde.

Foto: Hugo Barreto
Jéssica Antunes
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