Parque da Cidade, Vila Planalto e Gama foram palco de muita alegria no domingo (23).
Agência Brasília

Fotos: Ludimila Barbosa / Secec

As crianças tomaram a iniciativa de dançar no final da chuva que caiu na manhã de domingo (23) no Estacionamento 4 do Parque da Cidade, durante a folia do bloco infantil CarnaPati. Ao som do clássico Peixe Vivo, música de origem desconhecida, segundo o folclorista brasileiro Câmara Cascudo, e frequentemente associada a Juscelino Kubitschek –, elas improvisaram com sombrinhas de frevo que pendiam como decoração do teto das oito barracas de dez metros quadrados cada.

Pais e mães foram atrás, e o espaço virou um baile com a criançada fantasiada de super-heróis e heroínas de sempre, ao lado de tradicionais borboletas e joaninhas. Sobrava confete, serpentina, sprays de espuma, bolas de sabão e algumas poças de água. Bem no espírito do que afirma a idealizadora do Teatro Mapati, Maria Tereza Padilha, que teve apoio do Fundo de Apoio à Cultura (FAC), da Secretaria de Cultura e Economia Criativa (Secec), para a iniciativa: “As crianças são nossa inspiração, maravilhosas, não existe melhor”.

Na estrutura local, foi montado um gazebo para amamentação e estacionado um caminhão para contação de histórias. Não faltaram as tradicionais cantigas de roda e brincadeiras. Uma turma de 60 crianças de um orfanato foi levada em dois ônibus alugados e recebeu kits de lanches.

Ambiente seguro

A Polícia Militar encarregou-se de posto de identificação prévia dos menores, distribuindo pulseiras com o nome e o celular dos responsáveis. “O máximo que temos de ocorrência é uma criança que se desgarra dos pais”, explicou o sargento Wagner Pires. “Vamos ao palco, falamos o nome e está resolvido”. O local, cercado, só podia ser acessado depois de as pessoas passarem revista por seguranças particulares.

O analista de sistemas Sérgio Henriques e sua esposa, a contadora Laís Maia, moradores do Sudoeste, levaram as sobrinhas Alice e Milena, ambas de cinco anos, para a folia. “Ano que vem vamos trazer o nosso”, disse ele, em referência à gravidez da companheira. “A estrutura é boa, o local, seguro; só falta a chuva ajudar. A gente acaba se divertindo mais vindo com as crianças que saindo só nós dois”.

Mais adiante, o bombeiro da PM Rafael Martins – que estava de folga – e a esposa Mariana pajeavam Isabela, de três anos, se acabando sob confete e serpentina, e Felipe, de quatro, portador de paralisia cerebral, que acompanhava o movimento de sua cadeira de rodas. “Às vezes ele fica meio agitado com o barulho, aí o levamos mais para longe”, explicou o pai. O nível de ruído foi uma preocupação dos organizadores do bloco na construção do evento. “Nada de som muito alto. Precisamos respeitar os ouvidos dos pequenos, seus limites”, explicou Maria Tereza.

Vila Planalto

Quem passasse pela Igreja de Nossa Senhora do Rosário de Pompeia, mais conhecida como “igrejinha de madeira”, na Vila Planalto, por volta das 14h de domingo (uma hora depois do começo marcado para a apresentação dos blocos Tropicaos e Charretinha do Forró), não poderia imaginar o volume do cortejo que chegou minutos depois à praça onde fica o monumento, tombado pelo DF em 1988.

“A ideia do cortejo foi convidar os moradores daqui a se juntar a nós”, disse o produtor e percussionista da banda Charretinha do Forró, Thiago Fanis. Segundo ele, o pessoal da comunidade que ajudou a construir Brasília, onde foram erguidos dezenas de acampamentos – alguns deixaram estruturas que subsistem –, tem tradição no Carnaval com o bloco Vilões da Vila Planalto.

“Adoro no Carnaval de Brasília as várias atmosferas que coexistem”, resume a professora Marina Soares, ladeada pelo filho Joaquim, de nove anos. Ela acompanha o trabalho da Charretinha, cujos dez integrantes puseram o público para dançar ao som de músicas como Morena Tropicana, de Alceu Valença.

“A pegada do Tropicaos é diferente. Somos uma fanfarra sem-vergonha que coloca sotaque de forró em tudo”, resume Fanis, que tira uma onda na percussão. Com mediações do DJ Rastamani, responsável por temperar tudo com um pouco de cúmbia, estilo de dança sensual originária da Colômbia, os dois blocos passaram a tarde se revezando e com nenhuma preocupação com a chuva que pairava no céu, ameaçando punir os excessos.

Gama

Verdade ou não que “quem ama mora no Gama”, fato é que a cidade está disposta a construir uma agenda própria para o seu Carnaval. “A gente quer fazer folia aqui porque temos nossa cultura e muitos não podem ou não querem ir para o Plano Piloto”, sentencia Paulim Diolinda, poeta, compositor e produtor cultural pernambucano à frente do Encontro Carnavalesco dos Bonecos Dançantes, realizado na tarde deste domingo.

O evento, na Praça Lourival Bandeira, contígua ao Parque Infantil do Setor Leste – onde mais tarde os coletivos circenses do Gama fariam o Carnaval dos Brincantes – teve no FAC (como também o evento da Vila Planalto) o ponto de partida para voos mais altos, segundo Diolinda. “Ano que vem vamos fazer um evento melhorado, com a ajuda da administração regional”, planeja.


Segundo o titular da Região Administrativa II, José Elias de Jesus, a proposta tem seu apoio. “Estamos com o planejamento estratégico para 2020 pronto e queremos fazer um Carnaval fora de época, no meio do ano, provavelmente em julho”, afirma diante do prédio fechado do Centro Cultural Itapoã, testemunha de bons tempos para as artes do local.

E há já uma tradição local de artesãos que produzem bonecos de isopor esculpido, recoberto de papel ou de resina pintada. Com três metros de altura, menores que os pernambucanos, uma dezena deles, com “Barack Obama” à frente, bailava na praça, braços abertos movidos por articulação de madeira, chamando o público.

Ester, de três anos, correu para o colo da mãe diante da aproximação da “Noiva do Lago”, referência a um trágico acidente, reproduzido pelo imaginário local, que tirou a vida de uma moça afogada no lago Jacob a caminho do altar na vizinha Cidade Ocidental (GO). “É ótimo ter a chance de trazer as crianças a um carnaval por aqui”, aprova a mãe de Ester, a empresária Fernanda Faria.

No âmbito da economia criativa, o mecânico Augusto “do Trenzinho”, como se apresenta, aproveitou a inciativa para levar seu comboio feito de vagões construídos com tambores de óleo de 200 litros, cortados, pintados, dotados de assentos com cinto de segurança e puxados por um minitrator de cortar grama, adaptado. Quantas viagens ela planejava fazer, ao preço de R$ 5 o passeio individual de cinco minutos pelo local? Ele olhou para o céu nublado por um instante antes de responder: “Não faço a menor ideia”.

* Com informações da Secec