Flavia Francellino

Há alguns anos, o conceito de ser mulher era bem defendido pela categoria feminina. Não só pelo fato de que elas orgulhosamente colocavam bobes no cabelo e viviam em um universo longínquo da chapinha e da progressiva de chocolate sem nenhuma histeria ou sintomas de depressão, mas também pelo fato de serem felizes e realizadas com elas mesmas. BB cream e CC cream eram realidades distantes, então apostavam no poder milagroso e multifuncional da Minancora – e o santo remédio branco parecia lhes bastar. Hoje, a mulher tem seu nécessaire lotado de sérum anti-idade que promete rejuvenescer até defunto, mas está completamente insatisfeita consigo, concordam? Passam pela crise dos 15, dos 20 e dos 30 anos, mas há quem tenha experimentado complexo até quando tinha apenas 10 anos.

Independentemente da idade, parece que as mulheres de hoje partem para dois extremos em busca de encontrar um pouco de valor: ou começam a agir como um homem para afirmar que não é um ser frágil ou apostam no extremo do que chamam de “a arte de ser mulher”, buscando se sentirem seguras por meio de uma série de atitudes supérfluas que falaremos mais adiante.

Quando opta por engolir a “cartilha da mulher independente” com considerações restritas de que para alcançar seu lugar ao Sol precisa pensar como um homem e até se vestir como um, o resultado são mulheres azedas e avessas à submissão, já que gostam de mostrar quem é que manda no pedaço.

Agora, caso não queira fazer parte do desse grupo seleto, elas escolhem participar da Sociedade da Mulher “Mumificada”, recorrendo a plásticas e tratamentos estéticos que prometem esticar e levantar tudo o que se imaginar. O manual incentiva a exibir o “que é bonito” usando roupas mais curtas do que as que encontramos na sessão infantil. Elas fazem o que podem e o que não podem na tentativa de se satisfazer. Exagero?

Não é bem o que parece. As mulheres estão jogando no ralo tudo o que poderia torná-las mais femininas, se submetendo a estereótipos que as impedem de serem elas mesmas e tornando-se intolerantes e cruéis. Não é à toa que vemos tanta insatisfação. Convido você, leitora, a fazer questionamentos sobre o que acontece nos dias atuais, onde vemos, de forma sutil, a mulher impedir a si própria de ser ela mesma e a declarar guerra a quem é.

Aversão a ser feminina

Parece que a bola da vez do universo feminino é ter alergia a si mesma. Recentemente, a empresa P&G em uma campanha para a marca Always americana trouxe uma reflexão sobre o que seria fazer coisas “como uma menina”. Convidou homens e mulheres jovens para encenar as seguintes situações: correr como uma menina, lutar como uma menina e jogar bola como uma. Os resultados foram caricaturas de comportamentos que, quando interpretadas por meninos, ficavam ainda mais estereotipadas e rotuladas por causa do desempenho fraco e frágil, o que reforçava a imagem negativa e pejorativa da qual muitas mulheres querem fugir.

No entanto, quando meninas mais novas foram convidadas para interpretar a mesma descrição, não se fizeram depreciadas e deram o melhor de si, atendendo aos pedidos com garra e força de vontade. Questionada sobre o que significava “correr como uma menina”, a garotinha de vestido rosa esclareceu o que significava para ela: “correr o mais rápido que eu puder”.

O intuito da marca, batizada como #likeagirl, foi mostrar que podemos fazer coisas incríveis, se deixarmos de usar essa expressão de “agir como menina” como uma fórmula para a mulher humilhar ou diminuir a si mesma. Acontece que muitas negam o fato de serem femininas em seu comportamento para não serem rotuladas de “Mariquinhas” – como se o fato de ser mulher fosse algo ruim.

Em um bate-papo descontraído, as escritoras Cristiane Cardoso e Nanda Bezerra revertem a situação defendendo que ser mulher em pleno século 21 envolve palavras pouco presentes e desconhecidas no cotidiano de muitas: feminilidade e graciosidade. Mas o que é ser graciosa, afinal?

“Toda vez você faz cara amarrada, fala palavrão, grita com as pessoas ou faz uma cena, tais comportamentos feios roubam sua graciosidade. Mas quando você é simpática, agradável, educada e discreta, tudo isso faz parte da graciosidade”, explica Cristiane.

As escritoras também destacam que, às vezes, as mulheres investem tanto na maquiagem, no cabelo, em cirurgias, vão diariamente à academia, porém, o que está dentro delas é o que complementa a beleza.

Se, por um lado, vemos que a graciosidade chama atenção por si só, Nanda levanta a questão de que a mulher chama a atenção para si de forma errada: “Eu pensava que para atrair um homem tinha que me colocar em exposição para que notassem que estava ali. E é exatamente o contrário, pois são essas que estão em exposição que eles não querem para a vida toda.”

Como vemos, a síndrome que a mulher crava nela mesma é desnecessária. As vitórias no cenário feminino, inegáveis, e os artifícios que temos ao nosso alcance não são motivos para anularmos quem somos. Podemos ser femininas e graciosas e, ainda assim, sermos donas de muitas conquistas. O jeito é parar de lutar contra si mesma e investir nos próprios talentos, sem abrir mão de sua essência.