Rê Campbell

“Mas você é um animal. Querida, está na sua natureza.” Esse é apenas um dos trechos da música Blurred Lines, do cantor norte-americano Robin Thicke. Se a letra já mostra falta de respeito com as mulheres, o videoclipe da canção vai ainda mais longe. Nas imagens, Thicke dança rodeado de moças seminuas, como se todas estivessem à disposição dele.

O tratamento grosseiro dado às mulheres em videoclipes não é exclusividade do cantor Robin Thicke. Uma pesquisa britânica divulgada no início de agosto aponta que as mulheres, especialmente as negras, são frequentemente retratadas de forma hipersexualizada nos vídeos de música.

Chamado de Performances Pornográficas, o relatório afirma que os homens são apresentados como personagens dotados de poder e dominação, enquanto as mulheres aparecem como receptoras passivas do olhar deles. Já as mulheres negras, em particular, são relacionadas à ideia de seres “selvagens e animalescos”. As conclusões são da pesquisa encomendada pelas organizações End Violence Against Women Coalition (Coalizão pelo Fim da Violência contra a Mulher), Imkaan e Object.

Desvalorização e violência

Quais são as consequências dos vídeos que tratam a mulher como mero objeto? Segundo as organizações responsáveis pela pesquisa, esses videoclipes criam um “contexto favorável” para a violência contra mulheres e meninas. Além disso, pessoas que assistiram às imagens em um ambiente controlado estão mais propensas a admirar o comportamento promíscuo masculino e reforçam a ideia da mulher como objeto.

O estudo comprova algo que já é evidente há muito tempo: os videoclipes estimulam a desvalorização feminina. Isso ocorre porque a exibição constante de mulheres seminuas e em posição inferior aos homens acaba transformando o tratamento desrespeitoso em algo natural para a sociedade.

Para garantir a valorização da mulher, a pesquisa britânica pede alterações na representação da imagem feminina em vídeos musicais e a adoção de classificação etária para todos eles. Além disso, o estudo sugere que as gravadoras ouçam a opinião de mulheres antes de lançar os vídeos.

O que você pode fazer



O tratamento grosseiro dispensado às mulheres ainda está enraizado na sociedade e aparece em músicas, filmes, no ambiente de trabalho, nas ruas e na publicidade. Recentemente, um ensaio fotográfico de moda provocou polêmica na Índia justamente por mostrar uma mulher sendo apalpada por homens dentro de um ônibus. Segundo reportagem da BBC, muitos indianos protestaram nas redes sociais dizendo que as fotos eram uma tentativa de dar um sentido positivo ao estupro coletivo que chocou o país em 2012.

O autor das imagens (ao lado), o fotógrafo Raj Shetye, tentou se justificar e disse que o ensaio era “apenas um retrato da situação das mulheres no país”. Não teve jeito: as imagens receberam milhares de críticas. A atriz indiana Amrita Puri postou a seguinte mensagem no Twitter: “Estupro não é inspiração para um ensaio de moda”. Após os protestos, o ensaio foi finalmente retirado da internet.

A reação dos indianos é apenas um exemplo de como as pessoas podem demonstrar insatisfação ao tratamento pejorativo dispensado às mulheres. Cada cidadão deve ajudar a garantir o respeito e a igualdade de direitos entre homens e mulheres.

A defesa da valorização da mulher pode ser feita todos os dias, em pequenas atitudes. Se não concordamos com o conteúdo de um videoclipe, por exemplo, basta desligar a televisão ou evitar ver o vídeo pela internet. Se não gostamos de músicas que se referem à mulher como objeto, o melhor a fazer é não ouvir mais essas canções. Se uma marca usa imagens de humilhação feminina para aumentar suas vendas, a alternativa mais sensata é não comprar seus produtos. A construção de uma sociedade mais justa e respeitosa depende da contribuição de todos – homens e mulheres.

Cavalheiro às avessas

Em 2013, o cantor sul-coreano Psy se desculpou publicamente pelo conteúdo do videoclipe da música Gentleman. Exibido mais de 700 milhões de vezes, o clipe mostra o artista maltratando mulheres em diferentes situações. Em uma das cenas, Psy altera a velocidade de uma esteira ergométrica, fazendo uma moça cair do aparelho em movimento. Ele também empurra uma xícara no rosto de uma mulher e faz outra cair de uma cadeira. O cantor declarou que não tinha a intenção de ofender ninguém. Mesmo com letra que diz “Eu sou um cavalheiro filho da mãe”, a música Gentleman fez sucesso no YouTube e tocou em diversas rádios do Brasil e do mundo. Será que todas as pessoas que ouviram a canção concordam com seu conteúdo?