Iva percorreu 150 km atrás de um médico para a neta: não conseguiu atendimento no Hmib. Foto: Kléber Lima

Falta de médico não é novidade no serviço público, mas uma pesquisa do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) mostra um dado que contraria a realidade dos prontos-socorros: o DF tem a maior quantidade de médicos por habitante do País. A proporção é de 4,35 a cada mil moradores – bem maior que o índice nacional, de 2,18.

Então, se há muitos profissionais, por que eles não são suficientes nos hospitais da rede? Para o Conselho Regional de Medicina (CRM-DF), o problema é a falta de gestão. Já a Secretaria de Saúde culpa a evasão.

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Enquanto esse imbróglio não é solucionado, pacientes passam por problemas como o de Iva Soares dos Santos, 46. A doméstica saiu do município goiano de Marajó, a 150 km de Brasília, para tentar uma consulta para a neta Antonella, de quatro anos. Desde o último domingo, a menina apresenta algum tipo de alergia e não para de chorar. Sem conseguir atendimento onde mora, ela correu para o Hmib, na Asa Sul.

Depois de esperar várias horas, passou pela triagem, mas a bebê não foi recebida por um médico. O hospital estaria muito cheio e sem pediatras suficientes. O jeito foi correr para o Hran, na Asa Norte. Apesar da falta de pediatras na rede pública, essa, segundo a pesquisa, é a segunda categoria com mais profissionais no DF: 1.508. No topo do ranking estão os especialistas (1.904) e em terceiro lugar a cirurgia geral (1.448).

Falta gestão

O índice do Distrito Federal ficou acima de grandes capitais como Rio de Janeiro, que tem 3,55 médicos para cada 100 mil habitantes, e São Paulo, com 2,81. Para o secretário do CRM-DF, Jorge Gomes de Araújo, a rede pública do DF perdeu o prestígio que tinha há algumas décadas, provocando a migração para empresas privadas. Cerca de 60% dos profissionais estão fora do sistema público.

“É uma situação perversa você ver pessoas morrendo porque não há condições de dar um medicamento. Você tem que fazer uma ‘escolha de Sofia’. O desgaste emocional é grande”, afirma o secretário. “Medicina de qualidade não é feita com imprevistos”, completa.

O integrante do CRM-DF avalia que há um inchaço no mercado local, mas prevê que a secretaria continuará a enfrentar déficit se não trabalhar para consertar os problemas do setor. Os médicos, segundo ele, vão continuar a escolher o serviço particular pela melhor condição de trabalho. “A migração de pacientes que tinham convênio para o serviço público foi grande nos últimos anos. A tendencia é que o problema aumente se não for solucionado”, reflete.

Aprovados recusam vaga de concurso

A Secretaria de Saúde garante que trabalha para resolver os problemas que mau funcionamento ao sistema. Seriam três frentes: melhora no abastecimento e na saúde primária, para que os hospitais não fiquem lotados; incentivos para que o índice de evasão caia; e nomeação de novos médicos.

Já nesta semana, a promessa é a nomeação de 718 profissionais da saúde, entre médicos, enfermeiros e técnicos, que devem entrar no sistema em até 30 dias. Em junho, haverá uma nova prova para a contratação de 416 médicos, parte deles emergencistas, para lidar com a lotação nos atendimentos do dia a dia. Além disso, serão chamados anestesistas, neonatais e pediatras, que são as especialidades que mais enfrentam déficit.

Paralelamente a isso, existe o abastecimento dos medicamentos e materiais da rede. Isso é tratado como uma tentativa de impedir a saída dos profissionais, já que, de acordo com o secretário-adjunto de Assistência à Saúde, Daniel Seabra, o índice de evasão nos concursos é de 40%. Eles nem sequer tomam posse.

Para o secretário-adjunto, apesar dos problemas, a média dos médicos no serviço público não é ruim, pois conta com 5.267 profissionais e cerca de 3 milhões de habitantes. Na contagem por grupos de cem mil habitantes, o índice ficaria em 1,75, próximo à cobertura nacional de 2,18, tanto na parte pública quanto na privada.

Saiba mais

– Os homens representam 52,4% da categoria.

– A idade média dos profissionais é de 44,2 anos, com um tempo de formação médio de 18,3 anos.

– A maioria dos profissionais está concentrada na faixa etária até 44 anos (60,2%).

Fonte: Jornal de Brasilia