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Por Bianca Marinho e Gabriel Luiz, G1 DF
Complexo 'Na Praia', na orla do Lago Paranoá, em Brasília (Foto: Bruno Soares/Divulgação)
A Justiça do Distrito Federal proibiu a emissão de ruídos na festa “Na Praia” que ultrapassem 55 decibéis durante o dia e 50 decibéis à noite. Divulgada nesta segunda-feira (21), a decisão do juiz Carlos Frederico Maroja de Medeiros define multa de R$ 2 milhões para cada descumprimento e fiscalização semanal do Instituto Brasília Ambiental (Ibram).
Responsável pela realização do evento, a R2 Produções e Eventos disse ao G1 que vai recorrer ainda nesta terça. Também informou que faz aferições periódicas dos níveis de ruídos e vai manter o calendário de eventos. Os shows estão previstos até o dia 10 de setembro e as vendas continuam disponíveis (leia a nota ao final desta reportagem).
Na prática, a determinação judicial pode comprometer a agenda de eventos, que ocorrem em um espaço aberto na Orla do Lago Paranoá.
Como argumento, a advogada Ana Carolina Osório – que entrou com a ação representando os moradores do Setor de Mansões Isoladas Norte – disse que não existe proteção acústica no evento e que o som incomoda 10 mil pessoas.
"Verificamos que o ruído alcançava 80 decibéis nas casas que ficam a cerca de cem metros da orla do lago e a aproximadamente 5 km do evento, por volta das 22h. Então, nós só pedimos que fosse cumprida a Lei do Silêncio", afirmou a advogada.
Evento 'Na praia', na orla do Lago Paranoá, em Brasília em 2015 (Foto: Um Nome Produção/Na Praia/Divulgação)
Para o juiz Carlos Frederico Maroja de Medeiros, da Vara De Meio Ambiente, o evento tem causado “incômodo” aos moradores de regiões próximas, inclusive da Vila Planalto, e impõe aos moradores que “suportem músicas em alto volume por vários finais de semana seguintes”.
De acordo com as regras atuais da Lei do Silêncio, o limite máximo de intensidade da emissão de sons e ruídos, para ambientes externos no período noturno é de 55 decibéis. Já em área predominantemente residencial e de hotéis, cai para 50 decibéis.
O Ibram informou ao G1 que é possível realizar shows em local aberto sem ultrapassar os limites previstos na lei. Segundo o instituto, a última edição do "Na Praia" cumpriu essa exigência.
Fachada do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (Foto: Raquel Morais/G1)
Críticas do magistrado
Ao contextualizar o setor cultural em Brasília e criticar a “flexibilização” de questões ambientais, o juiz afirma que o Setor de Diversões Sul tornou-se “um aglomerado de inferninhos e seitas religiosas”.
“O Setor de Diversões Sul, sonhado como uma 'mistura em termos adequados de Piccadilly Circus, Times Square e Champs Elysées' tornou-se um algomerado de inferninhos e seitas religiosas que convivem pouco amistosamente com o pouco de arte que ainda se produz por ali por alguns bravos resistentes”, afirma em um trecho da decisão.
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Juiz diz que Setor de Diversões Sul tornou-se um aglomerado de 'inferninhos e seitas religiosas' (Foto: Reprodução)
O magistrado também diz que, ao medir o nível de ruídos em qualquer local de Brasília, é possível constatar que a poluição ambiental é “norma”. Fazendo uma analogia ao crime de estupro, ele argumenta que é errado aceitar níveis de ruído acima do tolerado, por mais que seja o padrão.
"Argumenta-se em prol da 'flexibilização' da Lei do Silêncio, com o fato de que toda a cidade já se ultrapassa cotidianamente o nível legal de emissão de ruídos. Meça-se o nível de ruídos em qualquer local de Brasília, e constatar-se-á que a poluição ambiental é norma. Assim, veicula-se a tese da naturalização e inevitabilidade da poluição, chegando-se, por raciocínio tortuoso e falacioso, à conclusão de que, como já está tudo poluído mesmo, então que se legitime a poluição de uma vez. Equivale ao raciocínio canalha do 'se o estupro é inevitável, então que se relaxe e goze'."
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Ao fazer analogia ao crime de estupro, magistrado argumenta que é errado aceitar níveis de ruído acima do tolerado (Foto: Reprodução)
Ainda na decisão, o juiz diz que o Ministério da Cultura enfrenta um "desmonte". Também aproveita para criticar a isenção de imposto a igrejas e outras organizações religiosas, que ele qualifica como "verdadeiras máquinas de dinheiro".
“Em nível nacional, assiste-se ao melancólico desmonte do Ministério da Cultura, e a um histérico, injusto e boçal ataque desmedido contra instrumentos legítimos de fomento à cultura, tais como os incentivos materiais oriundos da Lei Rouanet (quase na mesma medida em que se despreza ou se estanca a discussão sobre a manutenção da injustificável isenção tributária de organizações religiosas que hoje se constituem em verdadeiras máquinas de arrecadar dinheiro)”, diz Maroja na decisão.
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Juiz do DF diz que Ministério da Cultura enfrenta 'desmonte' (Foto: Reprodução)
Ele também declara que “a cidade não pode ser vista como mero aglomerado de pessoas reunidas apenas pelo interesse de crescer e reproduzir-se (como porcos...), com a preocupação estrita de se fazer dinheiro a qualquer custo”.
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Na decisão, juiz do DF diz que cidade não deve ser vista como aglomerado de pessoas reunidas pelo interesse de rereproduzir-se como porcos (Foto: Reprodução)
Ao G1, a assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça disse que o juiz e o tribunal não podem se pronunciar sobre decisões judiciais e que o magistrado “fala nos autos”. Até a publicação, o Ministério da Cultura não havia se manifestado.
Histórico
Também é do juiz Carlos Frederico Maroja de Medeiros a decisão de 2016 por suspender a mudança do nome da ponte Costa e Silva para Honestino Guimarães, no Lago Sul. Ele determinou que as placas com o nome fossem mantidas, mas que um desfecho para o assunto parta da Câmara Legislativa.
Em 2013, Maroja foi acusado de incluir em uma sentença termos ofensivos ao Ministério Público, e o Conselho Nacional de Justiça determinou que o TJ deveria decidir se instaurava ou não processo administrativo disciplinar contra o magistrado. O tribunal informou que não tem conhecimento de processo contra o magistrado.
Veja a íntegra da nota divulgada pela R2 Produções e Eventos:
"A R2 Produções e Eventos externa surpresa com a decisão liminar concedida pela Vara de Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário do Distrito Federal nesta segunda-feira, 21 de agosto de 2017.
O jurídico da empresa está analisando o inteiro teor da decisão e irá recorrer ainda hoje com o objetivo de reformar a decisão. Em nenhum momento a empresa foi notificada e, portanto, não teve oportunidade de apresentar suas contrarrazões.
A R2 Produções e Eventos reitera que mantém o calendário de eventos e que faz aferições periódicas dos níveis de ruídos, sempre aquém do limite permitido pela legislação. É importante salientar que a decisão judicial não proibiu ou cancelou shows. Se limitou a estabelecer parâmetros para a realização dos mesmos.
O órgão público responsável pelas medições, o IBRAM (Instituto Brasília Ambiental), nas ocasiões em que foi instado a aferir o nível de ruído atestou que o evento apresentou resultado abaixo daqueles permitidos pela Lei em áreas não residenciais."
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