A apresentação da reforma de maneira fatiada é a aposta de Jair Bolsonaro para aprovar suas propostas ainda no primeiro semestre. Aliados dizem que aproveitar o projeto enviado por Michel Temer pode ajudar na discussão entre parlamentares.

Idade mínima de aposentadoria será o primeiro ponto apresentado pelo presidente eleito ao Congresso, na proposta de fatiamento defendida por ele(foto: José Cruz/Agência Brasil )

O presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), afirma que, no primeiro semestre de 2019, o Congresso votará a reforma da Previdência. Apesar de uma certa resistência por parte dos aliados, a proposta de apresentar o assunto de forma fatiada é encarada pelo pesselista como a melhor forma de conseguir a aprovação. “Primeiro mês é impossível”, admitiu Bolsonaro. “Mas, nos primeiros seis meses, com toda a certeza, o Congresso começará a votar as propostas”, acrescentou.
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Embora não tenha entrado em detalhes sobre o que pretende propor, o presidente eleito afirmou que a ideia é começar pelo estabelecimento de uma idade mínima, com uma diferença de tempo entre homens e mulheres — já se adiantando às críticas que receberia se mantivesse uma idade igual para ambos, como ocorreu com a reforma enviada por Michel Temer. “Nós vamos começar com essa ideia. Pode mudar até lá, mas isso não quer dizer que houve recuo. É um sinal de que houve mais negociação”, disse ontem, após sair de encontro com o alto-comando do Exército.

Nos encontros com os partidos, feitos ao longo da semana, Bolsonaro tem pedido apoio para aprovação das medidas que vai enviar para o Congresso, entre elas, a reforma da Previdência. Ontem, ele recebeu o PR e o PSDB. O líder da primeira sigla, deputado federal José Rocha (BA), comunicou que a legenda saiu da reunião já pertencendo à base do governo e, inclusive, se propôs a conversar com o presidente eleito para dar sugestões no texto. “Eu sou favorável a uma reforma dura para os novos que entraram no sistema e os que estão dentro do sistema fazer em projeto de leis aos poucos (Veja quadro)”, adiantou.

Mas nem todos se animaram com as conversas. Nos últimos dias, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que figurou como um dos maiores defensores da reforma no ano passado, sequer tocou no assunto. Na reunião de bancada que Bolsonaro teve com o MDB, na terça-feira, o próprio presidente eleito desconversou ao ser perguntado sobre o tema.

Bolsonaro precisará correr contra o tempo e formar alianças para aprovar a medida. A lua de mel com o presidente tende a durar seis meses, já que o segundo semestre é marcado por negociações em torno da eleição municipal que acontece no ano seguinte, lembra o cientista político Thiago Vidal. Por isso, o fatiamento da proposta pode ser perigoso porque, ao “jogar (as medidas) para frente”, Bolsonaro pode ter dificuldades para aprovar o restante das medidas. “Reforma se vota de uma vez, não tem como ir adiando. Depois terão outras questões também urgentes que inviabilizarão a aprovação no parlamento”, ressaltou.

Tanto deputados quanto especialistas acreditam que poderia ser uma estratégia melhor aproveitar, pelo menos em parte, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016 enviada por Temer, que já passou pela comissão especial e está pronta para ir ao plenário, o que economizaria tempo. O deputado Nilson Leitão (PSDB-MT), líder da legenda na Câmara, por exemplo, sugeriu que o presidente eleito encaminhe a atual PEC — ainda que alterando o texto prevendo apenas a regra de idade mínima, mudança que pode ser feita por meio de emenda.

“Temos que aprovar o que foi discutido, debatido e está pronto para ser votado. Aquilo que não está pronto pode vir em segunda etapa. Mas não pode desperdiçar tudo aquilo que foi gasto, este período todo, aprofundando o tema”, sustentou Leitão. O deputado Arthur Maia (DEM-BA), relator da PEC na comissão especial, afirmou que ajudará a aprovar a reforma de Bolsonaro “da forma que o governo escolher”, mas pontuou que é muito difícil, para qualquer governo, aprovar mais de uma proposta sobre o assunto. “Acho que qualquer governo teria dificuldade”, argumentou.
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Pontos delicadosHá praticamente dois anos, em dezembro de 2016, o presidente Michel Temer apresentou a reforma da Previdência que ficou mais de um ano em discussão na Câmara dos Deputados e, por fim, foi engavetada. O texto era ambicioso e cheio de pontos delicados, que acabaram sendo cortados um a um pelo relator, deputado Arthur Maia (PPS-BA), para agradar os deputados, preocupados com as eleições de 2018. No fim, ficou muito mais enxuta.

Desta vez, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, ensaia fazer o caminho inverso. Enquanto Temer mandou uma proposta completa, “para ter gordura para queimar”, Bolsonaro ensaia mandar primeiro só a carcaça — a idade mínima. A transição também ainda está em aberto. A proposta que restou de Temer previa uma transição de 20 anos até as idades mínimas chegarem a 62 anos, para mulheres, e 65, para homens. Bolsonaro disse que a ideia é “aumentar em dois anos para todo mundo a idade mínima”, mas sem citar a referência usada para delimitar isso. Hoje, os homens podem se aposentar se tiverem pelo menos 35 anos de contribuição e as mulheres, pelo menos 30 anos. Também é possível se aposentar com idade mínima de 65 anos (homem) ou 60 anos (mulher), desde que o tempo mínimo de contribuição seja de 15 anos.

As mudanças
Confira o que o próximo Executivo pode trabalhar para ser aprovado no Congresso

O que pode ser mudado por MP ou lei ordinária:
» Benefícios assistenciais, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC), desde que não desvincule o valor ao salário mínimo
» Fórmula de cálculo para pensão por morte, desde que o benefício não seja abaixo do salário mínimo
» Todas as regras previdenciárias 
dos militares


O que só pode ser mudado por PEC:
» Idade mínima
» Aposentadoria por tempo de contribuição
» Regras para servidores públicos
» Mudança de sistema — de repartição para capitalização
“É difícil ser patrão no Brasil”

O presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), disse que é preciso mudar “o que for possível” para melhorar o empreendedorismo no país. Ele destacou que as mudanças aprovadas em 2017 pelo Congresso Nacional deu uma certa “tranquilidade” aos empregadores. “Nós temos direitos demais e empregos de menos, tem que chegar a um equilíbrio. A reforma aprovada há pouco tempo já deu uma certa tranquilidade, um certo alívio ao empregador. Repito o que falei ontem (terça-feira): é difícil ser patrão no Brasil”, reforçou. O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, concordou: “O presidente eleito tem razão”, alegou. Ele citou, como exemplo, as dificuldades em diversas áreas como insegurança jurídica, problemas tributários, trabalhistas e ambientais.

Fonte: CB