Por Maíra Alves*, G1 DF
É comum escutar que vida de bailarino não é fácil, ou que dançar não "dá futuro". Viver do ballet é uma escolha árdua que, muitas vezes, precisa ser dividida com outras funções. Apesar dos obstáculos, quatro bailarinos brasilienses tentam realizar o sonho de viver da dança – com direito a um curso internacional para incrementar o currículo.

A oportunidade surgiu com uma comitiva da American Academy of Ballet (AAB), de Nova York, que veio recrutar talentos em Taguatinga, no Distrito Federal, para um curso de verão. A audição, realizada no fim de 2018, reuniu cerca de 50 interessados em passar até dois meses imersos no mundo da dança.

Destes, 14 bailarinos com 12 anos ou mais foram aprovados. O programa não prevê bolsa integral, mas garante descontos nas aulas, na hospedagem e na alimentação.

"O que vai determinar o número de bolsas e a porcentagem do desconto é o nível técnico e a aula executada por cada participante", explica a representante da AAB, Vitoria Almeida.

Na época, a companhia escolhida para receber a American Academy foi a Escola de Dança Noara Beltrami. A dona do espaço – e do nome na placa – diz que até esperava mais candidatos às vagas, mas justifica o baixo número como um "movimento cultural" de Brasília.

"O problema é a cidade, não é a audição. Aqui ainda tem essa coisa de que o ballet clássico, que a dança, é uma coisa supérflua. O pessoal faz ballet para dançar na escola, e não como profissão", diz Noara.

Os percalços não impediram, contudo, que a escola emplacasse quatro alunos para compor o curso de verão 2019, que começa em junho. Além destes, uma bailarina do Sesc também tem vaga garantida na escola nova-iorquina.

Conheça alguns dos escolhidos:

'Dança é uma coisa que sempre fez parte de mim'

A mais nova selecionada, com apenas 12 anos, é moradora do Gama. Apesar da pouca idade, Júlia Carneiro já ostenta uma trajetória de 9 anos como bailarina no Sesc.

"Fico preparando o meu psicológico e físico, se eu for. É uma experiência muito intensa. Nem esperava por isso, foi uma grande surpresa."

Os pais da estudante disseram que ela sempre demonstrou muito interesse por atividades artísticas. Júlia confirmou. "Eu digo que comecei a dançar a partir dos 3 anos, mas antes eu sempre dançava, já colocava música e improvisava."

"A dança me traz uma energia muito boa, uma coisa que eu não consigo explicar. É incomparável".

O pai, Bruno Bezerra, afirma que sente muito orgulho da filha e, agora, tenta lidar com a apreensão da distância durante o curso. "Daremos todo o apoio para que ela consiga curtir esse momento."

Bailarina há mais de 15 anos, Bárbara Elen Passos diz estar caminhando para a profissionalização no mundo da dança. A estudante de comunicação teve a primeira experiência com o ballet aos 4 anos, ainda na escola.

Hoje, aos 19, Bárbara diz que o curso na American Academy of Ballet é como um sonho realizado. “Eu não tinha expectativa em passar. Eu tinha dado uma olhada no site da escola antes, e parecia ser de uma magnitude muito grande”, lembra.

"Sempre ficamos animados com uma oportunidade dessa, mas falta muito incentivo aqui em Brasília. É difícil a gente investir esse valor em algo que não sabemos se terá retorno."

'É uma ótima oportunidade, foge da realidade do Brasil'

A bailarina Bárbara Coutinho, de 22 anos, se enche de expectativa quando o assunto é o curso internacional. "Você dorme lá na escola, você come, faz tudo lá. Tem vários professores, de vários lugares e é num teatro."

Dançarina desde os 5 anos, a brasiliense rasga elogios à escola onde se formou como profissional. Hoje, ela atua no mesmo espaço como professora de ballet para pagar as viagens e acessórios demandados pela dança.

"Eu sempre fui privilegiada, meus pais sempre me apoiaram muito. Mas tem uma hora que a idade vai chegando. Não é só viagem: é sapatilha, meia, roupa, figurino, maquiagem."

Veterana em competições e festivais nacionais, Bárbara precisa ainda lidar com a incerteza de conseguir, ou não, financiar o curso. "Fiz as contas e o curso, por uma semana, custará R$ 7 mil. Fora as passagens. Precisa ser bem avaliado."

Este é o lema que impulsiona o bailarino Warley Castro, de 26 anos, a se permitir romper com os próprios limites. "Eu sou meio rebelde", conta, enquanto ri de si mesmo.

Há 10 anos, Warley teve o primeiro contato com o mundo da dança. O convite veio de uma amiga, que pediu a companhia dele para uma aula experimental de ballet. Desde então, o morador de Samambaia vive o amor pela dança.

"Quando comecei a dançar, meu sonho era ser um bailarino internacional, viajar o mundo. Hoje, para ganhar dinheiro, faço alguns bicos como bailarino. Já cheguei a trabalhar em 11 lugares ao mesmo tempo", relembra.

Sobre a expectativa pelo curso, Castro se mostrou preocupado. "É sempre um obstáculo, a questão financeira." Até essa semana, ela ainda não sabia se teria dinheiro ou patrocínio para cursar os dois meses de estágio.